quinta-feira, 16 de setembro de 2010

O VÉU PINTADO DE MAUGHAM


THE PAINTED VEIL
W. SOMERSET MAUGHAM

Este romance, publicado em 1925, aborda a sociedade inglesa dessa época e a visão que ela tinha, principalmente sobre o comportamento feminino. A figura principal é uma jovem de 22 anos, educada para ser elegante, bela e depois casar-se. Criada por uma mãe dominadora e ambiciosa é privilegiada por sua beleza, sendo sua irmã caçula, a comum Doris preterida na casa. Seu pai é um homem trabalhador, o chefe de família que traz o sustento em troca de nenhum afeto ou consideração. Chegando aos 25 anos, ainda solteira vê-se em uma situação difícil, pois sua irmã sem grandes atributos iria casar-se antes dela, com um rico jovem. Impelida pelo medo de ficar para trás e pela tirania de sua mãe aceita casar-se com um jovem bacteriologista, a quem não amava e não tinham nada em comum, para viver em Hong-Kong, na época colônia da Inglaterra. Os diálogos são aterradores para os dias de hoje, pois veremos como essas mulheres eram classificadas pelos ingleses da época, principalmente na China, onde pretendiam ter um poder muito grande. Após apenas dois meses de sua chegada, Kitty Fane apaixona-se perdidamente por um homem casado, charmoso e sensual. Carente, põe nas mãos de Charles Towsend sua vida e destino, absolutamente certa de que era correspondida. Um dia, Walter, seu marido, voltando para casa mais cedo descobre o relacionamento de sua mulher. Esse homem inteligente e dedicado à sua profissão, que adorava sua mulher apesar de saber que não era amado, não transige e a deixa sem muita escolha: ou ela iria com ele para uma localidade distante da China, para tentar vencer o vírus da cólera que dizimava a cidade ou admitiria que ela se divorciasse, um ato escandaloso na época, casando-se com seu amante, exigindo porém um carta escrita por sua esposa, Dorothy, que o deixaria livre para um novo relacionamento. Ocorre que Walter conhecia bem esse homem vaidoso e sabia que ela jamais deixaria sua família por uma jovem inexperiente. Confrontando o amante percebe com desespero que suas palavras de amor eram apenas belas palavras, nada mais. Sem saída, acompanha seu marido nesta longa marcha pelos confins da China, estabelecendo-se em um pequeno e simples bangalô. Aos poucos, conhecendo o único inglês que morava nesse local, é induzida a conhecer um convento de freiras francesas, que cuidavam de crianças órfãs e dos muitos doentes da região. Sem perspectivas, resolve juntar-se a elas e ajudar com que fosse possível. Passa a cuidar de crianças pequenas e sente-se, pela primeira vez útil e, ao vivenciar tanto horror, imagina que sua atitude não fora tão grave, comparada com tantas mortes e desespero e que seu marido, mesmo não a perdoando, poderia tornar a vida de ambos mais amena. Todavia, uma grande surpresa a aguardava, ela estava grávida e não saberia dizer de quem seria o bebê. Ao seu marido, por sua competência e temperamento, resolve dizer a verdade. Não sabia quem era o pai. Walter é um personagem triste, com agudo senso de implacável justiça, extremamente tímido e inseguro como amante. Isso soa para ele como mais uma sentença de morte. Passa a dedicar-se cada vez mais ao trabalho. No convento, Kitty descobre o quanto era amado e respeitado por todos. Ela reflete como poderia ter sido diferente seu destino, se tivesse tido mais experiência e sagacidade e menos vontade de apenas estar casada antes da irmã. São tempos amargos para essa heroína, que era admirada, pois pensavam que ela estava lá por amor ao marido. Walter acaba infectado pelo vírus que estudava em seu laboratório e sucumbe a doença. Sua morte é dolorida e Kitty lamenta-a sinceramente por sua coragem e bravura, mas não o amava e de certo modo isso a libertou de uma grande carga emocional. As freiras não permitiram que ela continuasse naquela cidade tão perigosa e contra sua vontade foi obrigada a retornar para Hong-Kong, no navio mais próximo. Apesar das poucas semanas transcorridas, acha-se mais madura e segura. Seu desejo era vender todos os seus bens e viver sozinha em um hotel. Não queria especular sobre o futuro, pois já havia sido tão imprevisível com ela. Logo que o navio atraca no porto de destino, ainda acabando de fazer suas malas em sua cabine, é procurada pela última pessoa que poderia imaginar- Dorothy Towsend. Essa mulher joga-se em seu pescoço, dando-lhe suas condolências e pedindo para que ela fique em sua casa até que nasça o bebê! (Kitty, ó Kitty, que tipo de heroína lhe fizeram?) Ela vê-se compelida a aceitar o convite e passa a conviver com a família, chegando ao ponto mais degradante de sua vida. Volta a cair nos braços de Charlie! Enojada consigo mesma, resolve regressar imediatamente para a casa de seus pais, que jamais a aceitariam de bom grado. Ela teria uma pensão para sobreviver com seu filho e não ser um fardo tão grande para a família. Entretanto, durante a viagem recebe uma carta da mãe, bastante formal, que seria bem vinda, logo em seguida uma da irmã que também estava grávida e finalmente um telegrama de seu pai avisando que sua mãe, enfim, havia morrido. Doente há muito tempo sucumbira, provavelmente, ao câncer, palavra proibida nesses idos dos anos vinte. Ao chegar, encontra seu pai lendo o jornal, aparentando estar mais calmo e aliviado de seu fardo. Kitty conversa com ele e fica sabendo que fora promovido, e iria partir para a Bahamas. Tendo decidido vender sua casa, pede para que a filha mude-se para Londres e tenha seu filho lá. Ele ajudaria financeiramente à jovem, mas gostaria de estar só. Ela se desespera e implora que lhe dê uma chance para demonstrar seu amor e seu carinho, que lhe haviam sido negados. Agora era seu único parente, sua única tábua de salvação e queria seguir viagem com ele. Introspectivo e com grande senso de responsabilidade acaba cedendo e concordando que Kitty e seu bebê o acompanhem nessa grande jornada.
A leitura do livro, como enredo, é bastante atraente, mas o que é escrito nas entrelinhas me parece aterrador. A composição dos pensamentos dos personagens é bastante preconceituosa, mesmo para a época. As mulheres são um tanto tolas, vaidosas ou assertivas, devotadas aos maridos e prontas para qualquer sacrifício que os beneficie. Os homens podem ter, livremente, várias facetas. Os chineses são seres quase inumanos por sua raça e aspecto. Os bons exemplos e grandes personalidades honestas são sempre de indivíduos provenientes da Europa e com uma vasta ascendência superior. Para quem estiver curioso sobre estes aspectos e para aqueles que são admiradores de sua enorme literatura é um livro interessante, que chegou a ser proibido quando da sua primeira publicação.


SOMERSET MAUGHAM
Nasceu em 1874, em Paris, vivendo lá até os dez anos. A morte prematura de sua mãe, aos 41 anos o deixou muito traumatizado e seu pai morre dois anos depois. William é enviado para Kent, Inglaterra, onde será educado por seu tio, vigário, em Canterbury. Foi duramente tratado pelo tio e ridicularizado pelos colegas, pois falava mal o inglês e tinha baixa estatura, herdada do pai. Isso faz com que desenvolva um agudo senso de observação e crítica. Estudou na Alemanha filosofia e ao voltar para a Inglaterra estuda medicina e passa a dedicar-se à literatura também. A escrita era um hábito que adquirira aos 15 anos. Seu livro Servidão Humana, quase uma autobiografia, é um dos mais famosos do século 20. Era bissexual. Viajou pelas colônias inglesas do Pacífico, conhecendo-as bem. É considerado um dos maiores escritores ingleses. Em 1927 volta para o sul da França, onde morre em 1965.